Para especialistas, o alcoolismo acaba sendo tratado de forma simples pelo programa
Foto por ReproduçãoEspecialista diz que cenas como a de Dani Bolina
simplificam demais o problema do alcoolismo
No último domingo (13), o programa Pânico na TV, da Rede TV!, utilizou a paniquete por situações constrangedoras. Mas o que é considerado humor pelos integrantes do programa está virando polêmica
junto a comunidades que convivem diariamente com o problema do alcoolismo.
O A.A. (Alcoólicos Anônimos), maior grupo do mundo que trata do tema, declarou
que irá fazer uma reunião entre seus membros de São Paulo, na próxima segunda-feira
(21), para discutir a abordagem do álcool pelo quadro humorístico.
A intenção dos delegados, como são chamados os coordenadores dos grupos do A.A.,
é fazer com que os membros da associação opinem sobre o caso. Os Alcoólicos Anônimos
querem descobrir até que ponto o programa pode influenciar os jovens a adotarem postura
parecida a de seus ídolos. De acordo com o coordenador de mídia do A.A. em São Paulo, Sílvio Magalhães, o encontro será realizado no prédio do grupo, localizado no centro da capital paulista.
- Temos a intenção de esclarecer a população sobre o tema, e não proibir ou censurar algo.
Não somos contra o álcool em si, mas há pessoas que não trabalham bem com a questão e bebem compulsivamente. Essas pessoas têm que ser alertadas para os riscos de desenvolver a doença.
Para especialistas, expor situações de embriaguez na televisão faz com que um problema
complicado e que causa graves riscos à saúde seja tratado de forma simples. Claudia Mercon,
coordenadora do Programa de Atendimento ao Alcoolismo do Hospital Universitário de
Brasília, diz que se trata de uma visão “ingênua do assunto”.
– Se a pessoa está bêbada a ponto de se expor na TV, de ficar caindo na rua, não está
bebendo álcool de modo responsável. A bebida pode trazer prejuízos graves para o aspecto
físico da pessoa, para as relações familiares, para o trabalho. Tratar isso como piada pode
fazer com que o problema fique banalizado. Não é fazendo gozação que você vai mostrar
os problemas da bebida alcoólica.
De fato, o alcoolismo não é uma doença simples, nem para a própria pessoa ou para
aqueles que convivem com ela.
Aos 55 anos de idade, A.S.R.M. sabe bem o que é conviver com o problema. Depois de
ver seu pai morrer em virtude de uma cirrose hepática, ela se casou, aos 23 anos, com um
homem que mais tarde desenvolveria a doença. Seu marido procurou o A.A e ficou sóbrio
por nove anos.
Há dois anos e meio, no entanto, ele voltou a beber, o que fez com que ela pedisse a
separação e passasse a frequentar o grupo de apoio Al-Anon, que oferece ajuda a pessoas
ligadas a alcoólatras.
- A família tem que saber lidar com um alcoólatra. Muitas vezes, por medo ou até ignorância,
você acaba acobertando e incentivando a doença. Eu já cheguei a ligar várias vezes para o
trabalho do meu marido dizendo que ele estava mal e não poderia ir trabalhar, quando,
na verdade, ele tinha bebido demais na noite anterior. As pessoas ligadas ao doente não
podem incentivar o ato de beber, pois essa é uma doença progressiva, que se desenvolve
ao longo dos anos.
Ministério da Justiça
Procurada pelo R7, a Rede TV! não quis se posicionar sobre o assunto. A reportagem
também falou com o Ministério da Justiça sobre o tema. A instituição é responsável pela
classificação etária dos programas veiculados pelas emissoras de televisão no país.
A assessoria informou que, de acordo com a faixa indicativa para o Pânico na TV!,
de 14 anos, não há nenhuma contravenção em exibir imagens de pessoas embriagadas
no horário.
Questionada pela reportagem se não havia diferença entre mostrar alguém bêbado e
veicular imagens de indução ao alcoolismo e constrangimento, a assessoria do Ministério
voltou a afirmar que o programa é adequado ao público a que se dirige.